terça-feira, 26 de maio de 2009

Sr. Manuel Lopes

Num dia destes dei comigo a revisitar mentalmente a minha terra: as pessoas, os edifícios, os campos verdejantes, os lugares, as brincadeiras,... histórias da infância, da juventude e de hoje.
Neste apelo telúrico, a família do Sr. Manuel Lopes fez parte do meu imaginário, retive na memória da minha meninice a sua mãe, Srª Ana Rosa Fernandes, e o seu irmão, Sr. José Lopes, pequenos agricultores de subsistência com casa própria, pessoas ensimesmadas e isoladas do mundo, pacatas e trabalhadoras.
Esta família viveu no Largo do Padrão, no edifício onde hoje é a sede da Junta de Freguesia. As diatribes da rapaziada da faixa etária dos alunos da escola primária fez do Sr. Manuel Lopes, pelo seu aspecto físico, pela sua indumentária humilde e pelo seu modo de ser, lembremo-nos que ele era uma pessoa assocializada sem saber ler e escrever, o alvo preferido da irreverência juvenil, pegávamos com ele, pregávamos partidas, e fugíamos à sua frente com medo que nos apanhasse e nos açoitasse, coisas de Argivai de outros tempos.
Com o desenrolar dos anos o Sr. Manuel Lopes (31 de Dezembro de 1932, - 12 de Novembro de 2006) passou a ser o único elemento vivo da família, a viver sozinho em sua casa com uma modesta reforma, quantas vezes o vi exorcizando a sua solidão fruto da socialização entretanto adquirida, a tomar café, a fumar ou a beber um fino no Salão Social ou no Café Anjo, locais que frequentava regularmente.
Figura típica da terra, tantas vezes zombeteado, este homem que nos tempos da minha meninice me incutia medo, agora sorria e comunicava, num vocabulário pobre mas sempre com respeito, às variadíssimas acções e interpelações, ás vezes jocosas, dos circunstantes. Passou a ser visita praticamente diária dos locais acima referidos, Salão Social e Café Anjo, onde com o seu jeito humilde e a sua voz tonitruante pedia aos circunjacentes para pagarem um fino, outras vezes um cigarro ou um café, sempre com educação, quando, muitas vezes, a paga era a risota e a galhofa.
Este homem merece o nosso profundo respeito e a sua memória deve ser perpetuada como o maior benemérito da nossa terra. Não sabia ler e escrever, concitou a risota insensata e injusta de muitos de nós, mas, apesar disso, deixou-nos um belo edifício, sem o qual não teríamos a actual sede da Junta de Freguesia e nem teríamos a futura Creche, é importante que tenhamos isto muito bem presente - o Sr. Manuel Lopes ofereceu à sua terra tudo o que possuía, o actual edifício da Junta de Freguesia de Argivai e terreno anexo.
O que foi feito para perpetuar a nossa gratidão por este homem? Foi atribuido o seu nome a uma rua (travessa) secundária, confrontante com o Feira Nova, o que é pouco, atendendo ao muito que nos deu; considero uma grande injustiça, porque temos nomes de ruas centrais cujos titulares pouco deram, comparados com a generosidade do Sr. Manuel Lopes. Façamos justiça! Este homem era humilde, analfabeto, descuidado no asseio, usava roupa antiga, mas deu tudo a Argivai.
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Por mim e por muitos argivaienses:
Muito Obrigado Sr. Manuel Lopes!

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Pôr os pontos nos is

No exercício da actividade cívica na minha terra, participei pelas 21 horas do dia 18 de Maio de 2009 na reunião da Assembleia Geral da Argevadi, na qual após a leitura da acta da Assembleia anterior, que não compareci por motivos que oportunamente explicarei (fica para uma próxima oportunidade o antecedente historico e o triste relato do que lá se passou, que objectivamente não dignifica o nome da Argevadi nem o bom nome de Argivai, mas enfim, um dia destes farei a devida divulgação...), solicitei a palavra, onde abordei questões importantes relacionadas com determinados procedimentos legais e éticos de quem (penso que poucos) compõe a referida associação, por ter afastado abusivamente o Presidente do Conselho Fiscal da Argevadi, com um património de centenas de milhares de contos oferecidos pela Freguesia de Argivai, pela Câmara Municipal e pelo Governo, com a mesma ligeireza com que se toma uma café. Esta atitude dos responsáveis pelo afastamento do Presidente do Conselho Fiscal configura uma sede enorme de poder absoluto, autofiscalizando-se a seu bel prazer - o que é anormal e pode revelar uma gravíssima falta de transparência. Como afirmei na referida reunião, irei tomar as devidas providências para que a legalidade, a ética associativa e os interesses da nossa terra sejam devidamente salvaguardados, nem que para isso recorra às instâncias necessárias.
Depois de alguns elementos terem intervido, chegou a vez do Sr. Dr. Sérgio, da direcção da Argevadi, virando-se para mim disse, que não simpatizou comigo a partir do exacto momento em que o Sr. António Luís lhe disse que eu tinha dito que não gostava da Srª Alexandra, do Conselho Fiscal, e mais, que eu disse que ela não devia fazer parte da Argevadi por não pertencer à Assembleia de Freguesia.
Costou-me muito ouvir aquelas aleivosias, porque a verdade é que não conhecia a Srª Alexandra antes da constituição da Argevadi e depois de a conhecer e até ao momento não tenho nada a dizer contra, pelo contrário, sempre tivemos um relacionamento cordial, franco e aberto, como deve ser, e assim desejo que continue.
No dia seguinte liguei ao Sr. António Luís. Sabia de antemão que não era possível ter saído da boca dele tamanha patranha, e da conversa que tivemos ele lamentou e repudiou literalmente estar metido nesta intriga, por não ter dito absolutamente nada daquilo.
Enfim, para que se conste, senti-me na obrigação de pôr os pontos nos is deste incidente lamentável.

sábado, 9 de maio de 2009

Círculo vicioso

Hoje, numa magnífica tarde soalheira de Maio, fui ao campo de futebol, onde a UDCA desenvolve as suas actividades desportivas, para apresentar ao meu amigo e presidente do clube, António Torres, um elemento da minha família que deseja praticar futebol.
Depois das apresentações da praxe, ele continuou a supervisionar as actividades desportivas que se estavam a desenrolar naquele momento, e eu fiquei a falar com amigos sobre assuntos de Argivai.
Fiquei deveras decepcionado, para ser mais claro: fiquei angustiado!
Uma vez mais verifiquei que as divisões entre as pessoas com responsabilidades na terra são insanáveis. Ninguém ouve ninguém, todos acusam todos, todos dizem ter razão, mas quem paga a factura destes desentendimentos é o desenvolvimento da nossa terra.
Com este clima de ressentimento e rancor, as pessoas com capacidade, valor e bom senso são desencorajadas a intervir na vida cívica da nossa terra, perpetuando-se os mesmos procedimentos causadores destes desentendimentos e arrastando consigo mais do mesmo, transformando-se num círculo vicioso.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Florbela Espanca


Ser poeta

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!
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Florbela d'Alma da Conceição Espanca tem hoje seus versos admirados em todos os cantos do mundo, diferentemente do que aconteceu quando ainda viva, época em que foi praticamente ignorada pelos apreciadores da poesia e pelos críticos de então. Os dois livros que publicou, por sua conta, em vida, foram "O Livro das Mágoas" (1919) e "Livro de "Sóror Saudade" (1923). Às vésperas da publicação de seu livro "Charneca em Flor", em dezembro de 1930, Florbela pôs fim à sua vida. Tal ato de desespero fez com que o público se interessasse pelo livro e passasse a conhecer melhor a sua obra. Dizem os críticos que a polémica e o encantamento de seus versos é devida à carga romântica e juvenil de seus poemas, que têm como interlocutor principal o universo masculino.
Do livro "Sonetos", Bertrand Brasil - Rio de Janeiro, 2002, pág. 118.
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Poema cantado pelos Trovante